Boa noite pessoas amadas! Recebi
hoje no Facebook o seguinte desafio de 2 amigos:
“Desafio Brasileiro de Poesia
O objetivo
é desafiar 5 amigos. Cada um terá um prazo de 24 horas para postar uma poesia
em sua própria linha do tempo e indicar mais 5 amigos para cumprir o desafio,
caso contrário deverá presentear quem o desafiou com um livro de poesias.”
Então, eu,
como amante de poesia, é óbvio que vou entrar na brincadeira e como são dois
amigos que me indicaram, eu resolvi postar um “longo” trecho (que vai valer
pelas duas poesias que eu teria que postar, ou mais); da “MATÉRIA DE POESIA”,
do maravilhoso “Nequinho” (um dos maiores poeteiros do Brasil e ainda vivo), o
qual ele dedicou como se fosse um “beijinho no ombro” para o Antônio Houaiss
(risos). E lá vamos nós:
II. COM OS
LOUCOS DE ÁGUA E ESTANDARTE
I.
Um João foi tido por concha
/ Atrapalhava muito ser árvore – assim como atrapalhava muito estar colado em
alguma pedra / Seu rosto era trancado com dobradiças de ferro para não entrar
cachorro / Só um poço merejava por fora dele e sapos descangotados de luar...
Esse João desenhava no
esconso: - Quem salvar a sua vida, perdê-la-á com árvores e lagartixas!
Pelos caminhos íngremes da
mata via estrelas subindo em lombo de borboletas
- Você dorme em paredes,
João?
- De jeito maneira / Eu não
tenho vasilha de dormir / Caracol de cipoal não chega nunca de ser um caracol
de parede / Conheço a fenda dos paus / Ser pedra depende de prática / Parede
abre a gosma é dos sapos / Já conheci raiz-de-santo nestes pedrouços / Não faço
hino de cera, meu amo / Pacu na água rasa só anda de prancha / Eu conheço. Eu
sei. Metade do sol já foi tomado por pássaros / E as árvores me atacam no mesmo
grau que as pedras...
Usava-se até o orgasmo: -
Estou apto a trapo! / A gente é rascunho de pássaro / Não acabaram de fazer...
Borboletas maduras chegavam
de pousar nos seus discursos: - Eu andei muito para enrugar meu couro / Cada um
tem seu caminho que percorre em todos os insetos / Eu sei até a hora que o
passarinho tira a roupa...
O que é feito de pedaços
precisa ser amado!
Eu conheço, eu sei. / O
orvalho é para quem pervaga...
Envelhecia a boca nas
folhagens / A morte gerava fora do caroço / Cinzas o penetravam como prego em
pneus / - Estamos somados à própria boca! / Na posição de Buda é que se vê
melhor como a gente carrega água na cesta!
- Você sabe o que faz pra
virar poesia, João?
- A gente é preciso de ser
traste / Poesia é a loucura das palavras:
Na beira do rio o silêncio
põe ovo / Para expor a ferrugem das águas eu uso caramujos / Deus é quem mostra
os veios / É nos rostos que os passarinhos acampam!
Só empós de virar traste
que o homem é poesia...
Quebraram dentro dele um
engradado de estrelas: - Vaga-lumes entortados de luz, eu vejo!
E a flauta dos pássaros
interpretando os homens / Madrugada esse João / Botou o rio no bolso e saiu
correndo... Pega! Pega!
Tropeçava em ladeiras
batentes trechos de sambas / Cansado de tanto correr esse João esbarrou com o
rio completo no bolso! / Entrou num terreno baldio de 10 x 20 sujo de mato /
Ramos de lua reverdeciam de latas / Chuvas mudavam nódoas de lugar / Não podia
virar cambalhotas que o rio desaguava nele / Lá fora a cidade no avesso purgava
/ O AZUL / passava de mosca em mosca / Estava acima de nossa fraqueza evitar
tanta mosca / Começou a chover / Palavras desceram no enxurro / Usava-se a cara
conforme o cuspe / Certas palavras
pediam para mostrar os pentelhos / Se andasse de cabeça para baixo o rio
escoava / Tinha de ficar de pé segurando o casaco no sol! / Os pássaros
assestavam seus cantos para o lado dos trilhos / Lagartos arrastavam os
vergalhos no bar / Lembrou-se do quarto: seu quarto cheio de marandovás que
comiam livros / Bem antes de amanhecer, tinha recomendado às autoridades um embrulho
de fezes que deixara sobre a estante / Não houvera intenção de roubar o rio /
Andava puído de sombras / Saíra apenas para passear e espolegar paredes /
Gostava de espolegar paredes...
Viajou viajou na madrugada
branca / No balde encontrava um jovem com um jovem com uma tramela na boca! / E
a cidade destripada dentro do olho / Águas verdes destruídas corriam sobre
tijolos / As iminências do lodo? / Ruas e casas ficaram sujas de seu canto / De
repente / Esse homem sorriu / Crianças / Em pleno uso da poesia / Funcionavam
sem apertar o botão / Pedras Negociavam com aves.
2.
Assim falou Gidian (ou
Gedeão) que assistia nos becos:
“Poeta Quintiliano me
nomeou Principal / Sou lobisomem particular / Eurico me criou desde criança pra
lobisomem / Me inventei / Fui procurar dentro do mato um preto Germano
Agostinho, que operava com ervas / Mandou botar as unhas no vinagre vinte dias
/ Aprendi grande / Só as dúvidas santificam / O chão tem altares e lagartos / Remexa
o sr. Mesmo com um pedacinho de arame os seus destroços / Aparecem bogalhos /
Quem anda no trilho é trem de ferro / Sou água que corre entre as pedras: -
liberdade caça jeito / Procuro com meus rios os passarinhos / Eu falo
desemendado / Me representa que o mundo é como bosta de onça, tem de tudo: - cabelos
de capivara casca de tatu...
Gosto é de santo e boi /
Saber o que tem da pessoa na máscara é que são! / Só o guarda me escreve /
Palavras fazem misérias inclusive músicas! Eu sou quando e depois / Entro em
águas...”
Ps.: Acho que só os 2 amigos
malucos que vão ter coragem de ler tudo isso, (ou talvez nem eles), mas aos que
tiverem despreguiça, eu garanto que vão se divertir! =D
Ps2.: Ref.: Poesia emprestada
do livro: MANOEL DE BARROS – POESIA COMPLETA – Ed. LEYA – 2013, páginas: 141 a
146. Imagens de domínio público da internet.